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Localização: Lisboa, Portugal

Sou uma mulher transexual de Lisboa, Portugal, onde nasci e cresci. Neste espaço poderá encontrar pensamentos, reflexões e comentários inerentes à minha vida como mulher trans. Seja benvind@ ao meu cantinho.

sexta-feira, abril 15, 2016

Respeito é muito bonito e eu gosto

Com o passar dos anos fui-me apercebendo de que, ao contrário do que pensava, uma larga maioria das pessoas que eu conheço não me conhece e me julga sem sequer ter fundamentos para isso. Isto implica o quê? Provavelmente que se essas pessoas acham que têm o direito de me julgar, seja pela minha aparência, seja pelos meus actos, seja pelo que digo e escrevo, eu também tenho o direito de as julgar a elas.

Sempre tentei ser imparcial e tomar decisões baseadas na minha intuição mais do que no meu raciocínio. Tentei nunca julgar ninguém por aquilo que essa pessoa é, aparenta, ou pelas posições que toma. Mesmo que eu não me reveja ou não concorde, cada um tem o direito ao seu pensamento, à sua expressão livre, ao seu arbítrio. Agora, a partir do momento em que essa pessoa se acha no direito de entrar na minha esfera privada e me julgar porque se acha no direito de achar que eu não sou como ela pensa que eu deveria ser ou agir, ou aparentar, não, isso eu não tolero nem admito.



Já fui muito condescendente com muita gente, o que apenas me levou a ser magoada e humilhada, principalmente por pessoas que eu pensava serem minhas amigas, em que havia um grau grande de proximidade e de respeito (pensava eu). Com o passar dos anos tornei-me menos tolerante e já não tenho paciência para a ignorância e estupidez natural destas pessoas.

Tal como eu não pré-concebo as pessoas, aceito-as como elas são, porque se acham elas no direito de fazer o oposto comigo? Estou praticamente a meio dos meus quarentas, não sou uma miúda inocente e deslavada que pode ser manipulada ou humilhada só porque sim. Isto passou-se e passa-se em várias facetas da minha vida e aquelas pessoas que mais arvoram aos sete ventos que são muito à frente, são precisamente as piores. Tudo são interesses, julgamentos, panelinhas e coisas que tais. E se me puderem prejudicar, nem que seja só para me verem ainda mais triste e deprimida do já habitual, melhor.

As razões dessas pessoas não as conheço. Porque provavelmente não existem. É só porque sim. Deve ser um prazer sádico em ver os outros mal. Mas isso comigo, ao contrário de muitos e longos anos da minha vida, já não funciona. Exemplos das atitudes destas pessoas são muitos. Desde fazerem-se passar por muito tolerantes e amigas e serem amigas íntimas de pessoas altamente transfóbicas e preconceituosas, de acharem que por serem trans as outras pessoas trans têm que se comportar, mostrar e viver como elas, de usarem subterfúgios para me humilhar e fazer passar mensagens a outras que não correspondem em nada à verdade.

Na realidade, isto é cada um por si, e à primeira hipótese deitam-te um balde de merda pela cabeça abaixo literalmente. Já para não dizer que acham que te podem passar atestados de estupidez também porque sim. Levei com isto da parte da minha suposta "família", de pessoas "amigas" de muitos anos, de outras pelas quais eu nutria grande estima, mas que só demonstraram não a merecer de forma alguma. 

Eu sou como sou e só têm que me respeitar. Não estou neste mundo para agradar a ninguém, nem para fazer papel de isto ou aquilo. Sou completamente transparente, e não tenho esqueletos no armário. Não tenho nada a esconder, e apesar de não sentir qualquer orgulho por ser uma mulher transexual, também não tenho qualquer vergonha. Nasci como nasci e quanto a isso nem eu nem ninguém pode fazer alguma coisa. O dever de todos é respeitarem-me como sou. Se não gostam, ponham-se a milhas, que este mundo tem muitas.

E não pressuponham coisas acerca de mim, porque não só não têm que o fazer, como eu não o admito. Não assumam que genitália tenho ou deixo de ter, não assumam que sou lésbica ou bissexual só porque vivo com uma mulher, não assumam que me prostituo para viver, não assumam que sou uma bananas que se convence com duas ou três patranhas. Não assumam nada, porque não têm nada que o fazer. Porque eu não assumo nada em relação aos outros. São como são e eu respeito-os, desde que também o façam comigo.

Já me iludi muito com a ideia de constituir uma família, por exemplo. Não aconteceu, porque nunca encontrei um homem que se mostrasse à altura, nem consegui reunir as condições para que tal acontecesse. Nessa busca incessante que fiz durante grande parte da minha vida, cometi muitos erros. Mas toda a gente erra. Só que ao contrário da maioria das pessoas que diz que não se arrepende de nada, eu arrependo-me de muita coisa. Como ter sido demasiado branda com certas pessoas e demasiado cruel com outras. Sou humana, temos pena.

E, para mim, ser-se humana é ter-se sentimentos e respeitar os dos outros. É respeitar aquilo que o outro é, na sua totalidade, e não brincar, humilhar, magoar, pisar os outros. Não assumam nada. Conheçam e tirem as vossas conclusões, se é que isso alguma vez fez sentido dentro da incongruência que é o ser-se humano. E não continuem a passar-me atestados de estupidez, ok? Obrigada por nada.

---> Foto de Pedro Simões, 2006