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Sou uma mulher transexual de Lisboa, Portugal, onde nasci e cresci. Neste espaço poderá encontrar pensamentos, reflexões e comentários inerentes à minha vida como mulher trans. Seja benvind@ ao meu cantinho.

sexta-feira, fevereiro 28, 2014

Os homens conseguem amar? Uma reflexão.

É uma reflexão interessante e que me surgiu depois de ler alguns textos e crónicas sobre a capacidade ou falta dela de os homens amarem. Isto dá pano para mangas, como qualquer assunto que tenha a ver com sentimentos e emoções. Principalmente porque as mulheres são educadas e induzidas a mostrar o que sentem, e os homens não.

E aqui entramos nas diferenças entre géneros e na própria expressão de género. O antigo e eteno "os rapazes não choram" continua a fazer, infelizmente, parte da educação de uma criança. Poucos são os progenitores que educam uma criança a ser ela mesma. Quero com isto dizer, deixá-la expressar-se livremente em todos os aspectos. Desde o intelectual racional ao emocional.

Naquilo que eu conheço, o machismo pós-latino continua a ser um "must" na educação e criação das crianças, seja qual for o género delas. Os lugares-comuns são tantos, que estava aqui horas a fazer uma lista. "Os meninos de azul e as meninas de rosa". Mas o que é isto? Isto é a mais pura representação desta sociedade machista em que até as cores têm género. Ridículo, no mínimo.

A capacidade amar dos homens é reflectida por este tipo de educação. Há factores como a testosterona exageradamente alta que afecta o comportamento dos homens (e também das mulheres), e não tenho dúvidas de que os nossos cérebros são diferentes, mas a expressão de género que cada rapaz assume reflecte tudo aquilo que aprendeu e apreendeu e que vai repetir, mesmo que com outras nuances.

Um homem com uma expressão de género extremamente masculina pode demonstrar uma sensibilidade extraordinária. Como um homem com uma expressão de género afeminada pode ser extremamente bruto, agressivo e de forma aparente, nada sensível nem emotivo. Dentro do espectro dos vários tipos de homens, encontramos tudo, como também no caso de nós, mulheres.
 
 

Mas o homem ama de uma forma diferente. O homem é naturalmente mais físico que a mulher. É mais sexual. Não quero com isto transmitir a ideia de que nós, mulheres, somos frigidas e que também não somos sexuais. Mas uma mulher antiga, como eu, necessita de um tempo que só o conhecimento e a empatia com o outro traduzem, que muitas mulheres, e os homens não necessitam.

Nada contra uma relação começar na cama. Tantas e tantas começam assim. Mas comigo é difícil que tal aconteça. Principalmente, e lá vou eu outra vez, porque já estou escaldada com o estereótipo da mulher trans ninfomaníaca, prostituta, oferecida, dada, tudo com conotações mais que negativas, sendo que somos vistas e transformadas em bonecas insufláveis. E, se eles nos vêem assim, temos pena, eu não compactuo nem nunca vou compactuar com isso.

Claro que os homens amam. Cada um ama à sua maneira. Mais correcta ou mais errada. Mas para alterar este tipo de mentalidades teríamos que começar de novo e educar os miúdos a serem eles, livres, sem restrições negativas, ensiná-los a lidar com os seus sentimentos e não agir por defeito. Não nos podemos esquecer é que no nosso país continuam e continuarão a morrer mulheres às mãos dos homens. Isto acontece por causa de muita coisa que referi, e porque a mulher continua a ser considerada um suposto pertence do homem. "Não és minha, não és de ninguém". E o resto da triste estória já nós sabemos. Vemo-la quase todos os dias nos jornais, nos noticiários, sabemos de casos que nos contam.

Ninguém pertence a ninguém. Duas pessoas amam-se e completam-se sem necessitarem deste tipo de possessão, deste tipo de ciúme, de doença, que uma sociedade, essa sim doente, nos transmite. Uma sociedade que diz que nós, mulheres trans somos aberrações, freaks e coisas que tais. Uma sociedade que não admite que uma criança tenha duas mães ou dois pais, como se isso fosse anti-natura. Anti-natura é uma sociedade que cria monstros preconceituosos e que discriminam tudo aquilo que, supostamente, é diferente.

Nada é igual. Logo, tudo é diferente. Então nada disto faz sentido. Os homens amam, sim. Mas amarão com muito mais amor e entrega se lhes for retirada esta carga tão pesada do macho-latino. Quando deixar de se misturar uma velha e arcaica moral judaico-cristã na vida e nos sentimentos e emoções de uma criança. Ainda sonho com uma sociedade em que todas as diferenças sejam elas quais forem sejam respeitadas por todos. Em que nós, mulheres, possamos amar sem medo, e que os homens possam amar sem ter que se armar. E tenho dito.