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Sou uma mulher transexual de Lisboa, Portugal, onde nasci e cresci. Neste espaço poderá encontrar pensamentos, reflexões e comentários inerentes à minha vida como mulher trans. Seja benvind@ ao meu cantinho.

quarta-feira, outubro 18, 2006

Mulheres

A vida reserva-nos um pouco de tudo, desde maravilhas como ver um bebé nascer, a horrores como ver quem amamos morrer. Por isso, e aos 35 anos, já passei por estas experiências e, muito provavelmente, passarei ainda por muitas mais. Talvez por isso seja considerada louca pelos meus amigos e amigas, pois sempre quis morrer antes dos meus pais.

Talvez porque a dor da morte deles seria tão grande que eu não a suportaria. Felizmente ambos ainda cá estão, apesar da idade e das suas maleitas. No outro campo tenho um desejo enorme de ver a minha sobrinha Marta crescer e tornar-se Mulher em frente aos meus olhos. Acompanhá-la, acarinhá-la, ajudá-la, e tudo o mais que me possa lembrar. Afinal estava com o meu irmão Miguel quando ela saiu da sala de partos, num berço, tão linda, tão pequenina, tão indefesa.

O nascimento dela deu-me imensa força para enfrentar tanta coisa. Foi graças a ela que eu tive coragem para começar as consultas de Transexualidade no Hospital de Santa Maria. Deu-me ânimo ao longo destes longos seis anos de processo apenas saber que ela existia e que me amava. Assim como eu a amo, e acho que só daria a minha vida por ela e pela minha mãe. As duas referências da minha vida.

Vejo-a como a filha que não me foi permitido gerar. Como Mulher Transexual nunca poderia ter filhos, a não ser adoptando-os. E eu sempre fui exigente nesse aspecto: queria um pai para o(s) meu(s) bebé(s). Como nunca consegui reunir as condições exigidas, ou seja, nunca encontrei um homem que merecesse minimamente ser pai dos meus filhos e meu companheiro, como sobrevivo com o subsídio social de desemprego, ninguém (obviamente), me deixaria adoptar uma criança.

Mas essa criança já existe: a minha Martinha. Sei que sou louca, mas vejo-a, sinto-a como se fosse minha filha também. Apesar de nos termos afastado muito por culpa minha neste último ano. Mas eu amo-a. Como se ela também tivesse sido gerada no meu ventre. Lembro-me de sentir os pézinhos dela a bater na barrigona da minha querida cunhada, Raquel, aos oito meses de gravidez. A Raquel agarrou na minha mão, pousou-a sobre a barriga e disse-me calmamente "sente... está aos pontapés". Foi a minha primeira noção de Vida. De que comigo, contigo, com todos nós, foi assim. E desejei tanto ter também aquela criaturinha tão bela dentro de mim. Vida dentro de mim. Mas não. Sou seca. Não existe vida dentro de mim.

E este post é dedicado às três principais Mulheres da minha vida: a minha mãe, a minha Martinha e a minha cunhada Raquel, à qual agradeço eternamente tudo o que sempre fez por mim.

Adriana Calcanhoto - "Fico assim sem você"


1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

É tão bom ver você assim entusiasmada, cheia de energia e de felicidade!!!! Parabéns pelo nascimento desse anjo, a Marta, que veio iluminar sua vida! O meu bem haja também para sua cunhada e irmão que deram origem a esse novo ser que vem tornar seus dias melhores. Tudo do melhor para vocês todos sempre!
Black Bird

outubro 19, 2006 11:32 da tarde  

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